Wednesday, October 17, 2012

Um Inverno

Se eu soubesse desenhar, desenhava tudo o que vejo nos meus sonhos.
Montanhas enormes, edifícios modernos com elevadores capazes de fazer curvas e contra-curvas e que não obedecem à mão humana.
Pautas de música cheias de notas e melodias que não consigo cantarolar nem tocar.
Gatos ainda bébés com dentes afiados e pés de cabra.
Desenhava também as minhas variações de humor e os vários estados de espírito por que passo.
A vontade súbita de vomitar que me dá, quando o cinzento dos dias cai sobre os meus ombros e me os massaja, até os meus pés se enterrarem no solo.
A alegria que sinto quando estou junto de quem amo, que é tão forte que se demonstra em lágrimas interiores que me enchem os maxilares.
Desenhava também o perigo que eu vejo em passar sobre o viaduto Duarte Pacheco e os meus passeios nos tectos daquele edifício cheio de plantas, arbustos e relva. Desenhava a casa amarela que fica no final do viaduto, como eu acho que ela é por dentro. Uma fachada.
Desenhava o efeito que um café pingado tem em mim, em dias que só me apetece definhar.
Desenhava os pensamentos todos cá para fora para que pudesse arranjar espaço para novos.
Desenhava pensamentos, actos e acções como se ainda soubesse o que é ir à missa.
Se eu soubesse desenhar, desenhava isto e o que ainda me falta sonhar, cheirar, viver, beber.
Se não fossem os "ses", a minha vida era um Inverno.

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