Friday, October 14, 2011

O esquilo bochechudo

Sou um esquilo.
Sou um esquilo pequeno, de fraca figura.
Trepo às árvores e corro sem olhar para trás.
Corro irracionalmente e inconscientemente em busca de mais e mais comida.
Não sou um esquilo gordo, pois apesar de comer muito, tudo o que como é-me ameaçado como vómito, e expelido em fezes.
As minhas bochechas enormes armazenam toda a comida que não aprecio, mas que não consigo deixar de sorver.
O que mais gosto é aspirado instantaneamente para o meu estômago, e todo o restante - acre, amargo, podre, sem sabor - fica reservado durante muito tempo nas minhas bochechas.
Bem que tento mastigar com a pouca força que tenho, mas de pouco ou nada me vale.
Sou um esquilo que sabe escrever.

Tuesday, October 11, 2011

Casa de espelhos


Desculpa se a tua nuvem não é a que chove sempre em cima de mim.
Desculpa não seres inteiramente aquilo que te prometeram.
Desculpa este texto não ser para ti.
Desculpa não ser uma gruta que só ecoa a tua voz.

Pensamentos hexagonais são os que me instruí a não ter.
Vivo dentro de um cubo, que às vezes se transforma num hexágono, e ambos vivem dentro de um círculo.
Esse hexágono tem uma porta giratória, que tal como as convencionais só gira numa direcção.
O seu suporte, agreste e calcetado, segue somente o caminho do círculo, que se situa paralelo ao vasto universo da insensatez de um quadrado maior.
O quadrado pequeno é a minha casa, o meu espaço.
Lá guardo a minha memória, os meus princípios, os meus objectivos, a minha sensatez.
Quando as portas giratórias se abrem para o hexágono, assumo o papel de capitão, mas trago sempre cascos do meu quadrado comigo.
Peço desculpa se o meu cubo não tem seis lados, como o hexágono quer impôr.
Viver nesse círculo, é algo que não me atinge, nem sei se me atingirá alguma vez.
O quadrado gigante, paralelo ao círculo, vejo-o de vez em quando - quando salto do meu quadrado directamente para o maior, e abro apenas uma fresta para entrar ar fresco.
Mas nem sempre o ar fresco é bom para a saúde.
Às vezes em demasia causa-me náuseas e comichões na garganta.
Pego então no meu saco-cama e arrasto-me para onde a minha disposição me levar.

Monday, October 03, 2011

A velhice é um estado de espírito

Velhos prematuros, são aqueles que não conseguem compreender o ambiente ao seu redor ou conceber a verdade em que acreditam, independentemente da idade que têm.
Creio que haja casos em que estes velhos prematuros depressa se tornam em loucos.
Pecados mortais habitam e desabitam em seus corpos, como as marés. Maioritariamente imprevisíveis (ou irregulares).
Os ossos de seus corpos são de açúcar, e facilmente bamboleam e desfalecem. Quando de velhos passam a loucos, os mesmos ossos tornam-se em caramelo duro e inquebrável, nada fácil de roer e que só tendem a partir os dentes de quem os ataca, negando-lhes a verdade ou compreensão, pelas quais durante anos penaram e lutaram.
E não há velhos loucos.
Só loucos ou velhos.

Não é isso

Doem-me os pés, mas não é isso que atrasa o meu passo.
A camisa sobe-me, mas não é isso que faz com que a ajuste.
O cigarro sabe-me bem, mas não é isso que faz com que o devore.
O sistema de rega assalta o ruído em redor, mas não é isso que embeleza o silêncio.
A mão é ligeiramente jovem, mas não é isso que faz a caneta deixar de tombar.
A cortina está desfiada, mas não é isso que faz com que se feche.
O cansaço senta-se na sala de estar, mas não é isso que me faz querer dormir.
As pedras da calçada alimentam-me a imaginação, mas não é isso que me faz sorrir.
A minha espinha dorme o dia inteiro, mas não é isso que me mói.
É que.. eu odeio esperar.
 
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