Monday, November 25, 2013

Eu escrevo, se tu desenhares.

Tenho saudades de pequenos momentos da minha infância que não me lembro de ter vivido.
Tenho pena de não poder viver com esta memória de adulto, as experiências de criança.
Tocar em coisas pela primeira vez, ver sítios pela primeira vez, interagir com outro ser humano sem ser balbuciando pela primeira vez, do meu primeiro sonho, da minha primeira tristeza, do meu primeiro adeus.
Há muitas coisas preciosas que as crianças vivem e que nunca, mas nunca, se vão lembrar. Essas memórias ficarão apenas cravadas junto das rugas que irão nascer uns anos mais tarde perto dos lábios e das cavidades oculares.
A inocência, a curta memória e o desprendimento que lhes assiste em tão tenra idade, não lhes dá espaço para sonharem e viverem num “se” que poderia haver no dia, ou momento seguinte.
Fascinar-me-ia poder reviver um dia de praia, enquanto escoltada pelos meus pais. A alegria de correr na areia, de mergulhar nas ondas do mar como se fosse a melhor coisa do mundo (prazeres de que ainda desfruto com a mesma intensidade), e brincar com outras crianças como se nos conhecêssemos há muito tempo.
O que estás a fazer?”
Um castelo que tem uma piscina à frente.”
Posso brincar contigo?”
E sem mais palavras, brincávamos a tarde inteira até que um dos nossos pais nos viria encher a cara de creme protector, pôr um panamá na moleirinha e comunicar-nos que não tarda nos íamos embora que já estava a ficar tarde. Naquele momento a única coisa em que pensávamos era em fazer uma birra daquelas pois não percebíamos o porquê de termos que ir embora, quando estávamos no melhor sítio do mundo, a brincar com a criança mais fixe do mundo, e o amanhã e o depois, eram conceitos que ainda não percebíamos. Daí até começarmos a choradeira era um instante. Depois vinha o outro pai que pegava na outra criança e nós só dizíamos um adeus despreocupado como se apenas nos tivéssemos cruzado na fila dos gelados ao contrário de termos partilhado uma tarde de intimidade infantil.
Depois crescemos.
Crescemos e a nossa inocência vai por água abaixo, os nossos conceitos ganham corpo, e as nossas decisões face às outras crianças têm obrigatoriamente que mudar.
Já quase ninguém se lembra dessas tardes na praia. Já ninguém quer brincar mais a isso. Agora queremos viver descansados e ter a nossa felicidade em ver as nossas crianças a brincar.
Custa-me desprender disto tudo.
Saio para a rua e observo os olhos das outras crianças agora adultas. Brinco com elas, e se alinharem na minha brincadeira, visto logo o meu fato-de-banho e corro com elas até à água.
Se não as encontrar no dia seguinte, agora sim, agarro-me aos “ses”.
 
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