Friday, July 27, 2012

Não marques nada

Encontra-me no sítio mais bonito da cidade.
Encontra-me onde a chuva que cai é lilás, a minha cor favorita.
Encontra-me onde o castanho madeira roça o verde velho, e o enferrujado roça o seco.
Encontra-me onde os cascos de madeira jogam ao coito, e não saem do seu poiso, rodeados pelos filhos da chuva e as pedras da calçada.
Encontra-me onde o verde quase branco enfeita a cabeça daquela miúda, que num chão imenso estica a perna direita para trás, como se fosse uma ginasta.
Encontra-me atenta e curiosa, separada do sítio mais bonito da cidade, por uma máquina que temo.
Encontra-me agora nos meus sonhos.

Sem entradas

A última estória que contei sobre alguém, tornou-se realidade.
A minha imaginação, o meu tacto sensível e a tinta da minha caneta, encontraram-se num ponto em que o futuro era tão fácil de prever, que a estória fluiu naturalmente.
Gostava de contar mais estórias que me contassem e prevenissem sobre o futuro, mas às vezes o que achamos que é mais previsível, é exactamente o oposto.
Se quisesse contar uma estória sobre ti, acabavas a limpar as tuas lágrimas ao cachecol que havia esquecido em tua casa.
Não conto, pois nem sequer sei o teu presente.
Bem vistas as coisas, nem o quero saber, nem o quero contar.
Guardo a tinta para os chocos.

Saturday, July 21, 2012

Seja uma figura na linguagem

Quando crescer vou vender metáforas em frascos, a copo e a avulso.
As metáforas são um óptimo escape para quando não temos tomates para dizermos o que queremos; para quando o cinismo e o desprezo se entrelaçam na nossa língua e comandam o nosso discurso social; para quando estamos cansados de ser sinceros e isso sair pior do que coisas entrelaçadas na língua ou tomates ainda verdes.
"Toma disto, engole aquilo, chupa aqui.
Rende-te à minha medicina ou desaparece.
Faz o que quiseres, mas não me apareças à frente se não reúnes as poucas condições que me fazem crer no pouco valor que têm os animais racionais, ditos humanos.
Obrigada, volte sempre."

Tuesday, July 10, 2012

Falta(s-me)

Se há textos sem lógica, como um quadro abstracto que nos permite trabalhar o conhecimento e a nossa imaginação, também há textos sobre tentar descobrir uma lógica onde não há, para tentar obedecer  a esse princípio que move quase todos os homens que é procurar uma lógica em quase tudo o que fazem.
Porque estamos aqui, porque comemos, porque amamos, porque sofremos, porque indagamos, porque sorrimos, porque choramos, porque temos um dialecto e uma cultura diferente de outros habitantes deste mesmo planeta. Porque sentimos saudades.
Porque sentimos saudades do que não conhecemos?
Porque sentimos saudades de um passado que mal vivemos e de um futuro que não sabíamos se iríamos viver?
Porque batalhamos em busca de uma felicidade ao invés de nos contentarmos com a que temos?
Porque já não temos idade para isso. Porque começamos a crescer e a achar que já é altura de nos satisfazermos e tentar agir segundo as nossas crenças embora possam ser inalcançáveis, por serem contrárias às da maioria.
E um dia, na terceira idade, nós insuportáveis, teimosos e rigorosos para com os nossos princípios e as nossas crenças, aí sim, seremos felizes.
Então a minha lógica ilógica é esta.
E continuarei a sentir saudades tuas, quem não conheci.
 
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