Thursday, December 29, 2011

Sonhos

Gostava que os meus sonhos fossem a minha vida.
Não para os viver, pois são caricatos ou assustadores.
Mas sim porque a minha vida são só sonhos, e estou farta de não os viver.
São iguais aos que se comem.
Doces, dá-se uma trinca, e puff.
Num instante eles desaparecem, e de repente, já estou cheia de fome.

Wednesday, December 14, 2011

Letra k

É tipo um livro ou filme, que lemos ou vemos e com que nos identificamos.

Estou tão confusa em relação à minha identidade e ao meu propósito enquanto ser humano, que toda a gente me troca o nome.

O livro de multas

Sacou do livro de multas e voltou a autuar-se.
Cada letra, cada palavra, cada texto, uma acta.
Uma lição da professora para levar para casa por se ter portado mal.
Às vezes gostava de ter uma lente atarrachada ao livro para que pudesse fotografar o momento em que se estava a atuar.
Não era por sentir pena de si própria que se autuava. Mas sim, para relembrar mais tarde, as parvoíces em que se banhava.

Monday, December 12, 2011

Uma anormal num pedestal

Jazia estendida, fria e sem feições.
Rasgando-lhe a carne tentavam decifrar os seus segredos.
Os ombros contavam nós infinitos, incapazes de se desmembrarem.
Nós grossos, como o peso da idade e das preocupações que não se desfaziam.
A única solução seria escavar a carne dos mesmos até se encontrar os pequenos ossos que os suportavam.
Tinha ombros tensos que caíam sobre as costas marrecas que se dobravam até aos joelhos numa tentativa de beijarem o chão.
O canal respiratório era minúsculo.
Tinha o diâmetro de uma palhinha, por ter deixado de utilizar a boca tantas vezes e utilizar somente o nariz para respirar.
Os pulmões eram negros, secos e magros, como o ar que respirava.
O coração apresentava várias escoriações e encontrava-se envolto num líquido gelatinoso em tons de ferrugem.
O estômago era uma fina película, que unia as costas com a barriga, e tinha toda uma espécie de fungos ao abandono.
O sistema reprodutor era o único que se encontrava são. Ironia.
Os pés eram chatos, mostravam-se calejados e com feridas abertas por os arrastar tentando cavar a terra que pisava.
A boca era uma miséria.
As gengivas encontravam-se desfeitas, e confundiam-se dentes com maxilares, pela ausência de uns, e presença visual em demasia dos outros.
A boca estava colada com uma viscosidade que parecia seiva.
Ao abri-la, desfez-se em pedaços. O odor era intensamente mau. Um cheiro terrível a enxofre.
Das cordas vocais só sobrava uma, resistente à sua apatia geral.
Os dedos eram velhos e enrugados, e as unhas garras amarelas, duras e fortes, nas pontas lascadas.
Após uma análise sem sucesso, taparam-na com um lençol, envolto em mistérios que não quiseram ser percebidos.

Sunday, December 11, 2011

Traços direitos em dias tortos

Um traço, outro traço, outro traço..
Já fiz uns seis traços hoje, e nenhum deles me apaziguou a puta da dor de cabeça que tenho.
Enrolo mais um cigarro, bebo mais duas cervejas e meia, fecho a conta e vou p'ra casa, deixando o sorriso numa valeta qualquer e encostando a apatia na almofada.
Sete traços agora.
 
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